Vale fecha acordo e vai destinar R$ 37,68 bilhões para reparar danos em Brumadinho
Trata-se do maior acordo de Medidas de Reparação em termos financeiros e com participação do Poder Público já firmado na América Latina.
O Governo de Minas, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) assinaram um termo de Medidas de Reparação, nesta quinta-feira (4/2), que garante que a empresa Vale seja imediatamente responsabilizada pelos danos causados às regiões atingidas e à sociedade mineira pelo rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, em 2019.
Trata-se do maior acordo de Medidas de Reparação em termos financeiros e com participação do Poder Público já firmado na América Latina, totalizando R$ 37,68 bilhões, e um dos maiores do mundo. As Medidas de Reparação viabilizam investimentos em benefício das regiões atingidas e da população, que começarão a ser realizados em breve. Cerca de 30% dos recursos vão beneficiar o município e a população de Brumadinho.
O governador Romeu Zema destacou que o termo não retira nenhuma responsabilidade da empresa, mas impõe novas obrigações, além de ser um reconhecimento da responsabilidade da mineradora. A assinatura do termo não prejudica as ações individuais por indenizações e criminais, que seguem tramitando normalmente. As tratativas tiveram mediação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
“Todas as partes envolvidas participaram, a cidade de Brumadinho, da região do Rio Paraopeba, as instituições públicas, todos foram escutados. Foi uma participação como poucas vezes se viu. Tivemos 11.800 atendimentos a pessoas que foram atingidas – segundo a Defensoria Pública -, mais de 8.000 acordos individuais. Muita coisa já foi feita e continua sendo feita além desse acordo. Outro ponto é em relação ao valor. Nunca no Brasil se fez um acordo dessa magnitude”, afirmou o governador.
Indenização para o povo mineiro
Zema destacou o empenho das instituições públicas para que a empresa reparasse os danos causados ao povo mineiro. “Não podemos mudar o passado, mas podemos fazer um futuro melhor. É exatamente isso que estamos concretizando aqui nesse momento com a ajuda de todas as instituições. Todos tiveram papel importantíssimo nesse acordo inédito em muitos pontos”, pontuou.
Romeu Zema frisou, ainda, que os recursos serão utilizados exclusivamente em investimentos em Minas Gerais.
“Nós estamos usando esta indenização, reparação, para o povo mineiro e não para o caixa do Estado. Continuaremos sendo um Estado com terríveis dificuldades financeiras, mas o povo mineiro vai receber o legado. São obras que significarão um legado para 21 milhões de mineiros. Este recurso está sendo destinado aos mineiros que foram afetados por essa tragédia, que não só nos entristeceu muito, mas fez com que a atividade econômica fosse seriamente afetada. E iniciamos agora um novo desafio, de darmos início a essas obras que vão gerar 360 mil empregos nos próximos meses e anos”, finalizou o governador Romeu Zema.
Conciliação
Os representantes dos Poderes destacaram a importância da concretização das medidas de reparação para que os atingidos e a sociedade mineira fossem ressarcidas com maior agilidade.
O presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), Gilson Soares Lemes, lembrou que o órgão iniciou as tratativas com todas as partes em outubro de 2020 em diversas audiências.
“Cerca de 200 horas de reuniões foram realizadas para que se construísse esse acordo. O Tribunal busca sempre a conciliação e a solução de conflitos de forma mais rápida. Esse acidente talvez tenha sido a maior tragédia ocorrida no meio ambiente em todo o Brasil. E o Poder Judiciário, junto às instituições jurídicas neste momento, dá uma resposta em tempo razoável à sociedade. Em dois anos, construiu-se um acordo da ordem de R$ 37 bilhões para que sejam ressarcidos esses danos”, ressaltou.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, disse, durante seu pronunciamento, que o Poder Público, por meio de conciliação, resolveu grandes questões sociais, econômicas, ambientais. “Eu diria que essas soluções não desprezaram a vida daqueles que se foram para mitigar a dor dos que ficaram, mas propiciam a reparação dos danos e a recomposição desses bens coletivos”, explicou.
O chefe do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Jarbas Soares, garantiu que o órgão irá continuar acompanhando os desdobramentos do caso. “Apesar do acordo, o Ministério Público estará junto aos atingidos para que todas as medidas acordadas nesta data sejam cumpridas em prol da população, do meio ambiente e do desenvolvimento de Minas Gerais”, disse.
Já o defensor público-geral do Estado, Gério Patrocínio, lembrou que foram mais de 8.713 acordos realizados individualmente e, aproximadamente, 12 mil atendimentos na sede da Defensoria Pública em Brumadinho. “Agora, esse recomeço firmado por esse acordo aumenta a nossa responsabilidade. Estamos preparados para o trabalho que virá pela frente”, afirmou.
Sobre a definição do valor, o terceiro vice-presidente do TJMG, Nilton Teixeira, explicou que para ajuizar uma ação é preciso ter um valor, mas que o pedido não corresponde sempre ao realmente devido.
“Foi isso que aconteceu. Não tínhamos um valor fechado, fixo. Ele estava em construção. A Vale, no primeiro momento, reconheceu o pedido. Em um segundo momento, passamos para o levantamento dos valores. Este valor de R$ 37 bilhões que foi discutido entre as partes é um valor racional e está devidamente justificado nos diversos anexos. Não adianta falar em R$ 54 bilhões se ele não se justifica”, disse.
Transferência de Renda e Demanda Direta dos Atingidos
Para o Programa de Transferência de Renda e para o atendimento da Demanda Direta dos Atingidos são destinados R$ 9,17 bilhões. Como parte das Medidas de Reparação, foi assegurada a criação de um Programa de Transferência de Renda para os moradores das regiões atingidas, sucedendo o auxílio emergencial, que seria encerrado no fim de fevereiro.
As regras do novo programa serão definidas com participação dos atingidos e auxílio do MPMG, do MPF e da DPMG. Até lá, os pagamentos mensais aos atingidos seguem com as regras atuais. Estão incluídos R$ 4,4 bilhões em recursos destinados ao programa e também R$ 1,77 bilhão, já aplicado no pagamento do auxílio emergencial.
Além disso, R$ 3 bilhões serão destinados a projetos de reparação a serem escolhidos pela população atingida. MPMG, MPF e DPMG também auxiliarão nesse processo.
Investimentos Socioeconômicos na Bacia do Paraopeba
O conjunto dos projetos de reparação socioeconômica e ambiental prevê a criação de cerca de 365 mil empregos diretos e indiretos e recursos no valor de R$ 4,7 bilhões. Parte dos projetos será apresentada diretamente pelas prefeituras.
Entre as ações estão a reforma e melhoria de todas escolas estaduais e municipais, a conclusão de obras das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) desses municípios, melhoria da Rede de Atenção Psicossocial e ações de promoção de emprego e renda.
Reparação Socioambiental Integral
Para a Reparação Socioambiental Integral serão destinados R$ 6,55 bilhões. O valor de R$ 1,55 bilhão será utilizado na compensação de danos ambientais já conhecidos. Um dos projetos desenvolvidos como compensação é a universalização do saneamento básico nos municípios atingidos.
O acordo não prevê, no entanto, teto financeiro a ser gasto com a reparação do meio ambiente. Todas as ações que no futuro se mostrarem necessárias para a reparação socioambiental serão feitas e integralmente custeadas pela Vale, seguindo o princípio do poluidor pagador, previsto pela Constituição Federal. A estimativa inicial de investimentos é de R$ 5 bilhões.
Segurança Hídrica
Para as obras nas Bacias do Paraopeba e do Rio das Velhas, que garantirão a segurança hídrica da Região Metropolitana de Belo Horizonte, inclusive de municípios atingidos, serão destinados R$ 2,05 bilhões. As intervenções têm o objetivo de melhorar a capacidade de integração entre os sistemas Paraopeba e das Velhas, evitando o desabastecimento.
Mobilidade
Serão destinados R$ 4,95 bilhões a projetos de mobilidade na Região Metropolitana de Belo Horizonte que proporcionam melhorias na mobilidade também nos municípios da Bacia do Rio Paraopeba. Um deles é a construção do Rodoanel, com três alças passando pela região atingida, que terá recursos para parte dos investimentos iniciais.
Também foram reservados recursos para complementar aporte federal em melhorias no Metrô de Belo Horizonte e para a melhoria da infraestrutura rodoviária, beneficiando estradas e pontes em condições péssimas e ruins.
Melhoria nos serviços públicos
Uma série de projetos, que somam R$ 4,37 bilhões, tem como objetivo a melhoria na prestação dos serviços públicos para os mineiros, em especial os residentes na Bacia do Paraopeba. Entre eles, há a renovação de frota, aquisição de equipamentos e melhorias logísticas para o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil e as polícias Militar e Civil, além de melhorias nas unidades de conservação do Estado.
Também está prevista a conclusão de obras de hospitais regionais e melhorias nas unidades da Rede Fhemig, que são referência para os municípios atingidos, com modernização dos hospitais João XXIII, Julia Kubitschek e João Paulo II.
O acordo de reparação prevê ainda a construção de uma biofábrica da Fundação Ezequiel Dias (Funed) com capacidade de produzir mosquitos Aedes aegypti com a bactéria Wolbachia, que reduz a transmissão de doenças pelo vetor. O desenvolvimento do método Wolbachia terá atuação inicial nos nos municípios atingidos.
Reparação já iniciada e medidas emergenciais
No acordo também estão inseridos recursos que já tiveram sua aplicação iniciada pela Vale em projetos de reparação, no valor de R$ 5,89 bilhões. R$ 4,39 bilhões foram investidos em ações de reparação, pagamento de moradias provisórias de atingidos, atendimentos psicossociais, fornecimento de água para consumo humano e irrigação, as obras de nova captação de água no Rio Paraopeba, obras emergenciais para contenção de rejeitos, além de repasses para o fortalecimento do combate à pandemia de covid-19.
Acompanhamento e fiscalização
Os recursos financeiros previstos no Termo de Medidas de Reparação não poderão ser usados para fluxo de caixa ou pagamento de salários. Eles terão fonte específica no Orçamento e os valores vinculados aos projetos. A Controladoria-Geral do Estado (CGE), o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais atuarão na fiscalização dos projetos executados pelo Executivo. O Poder Público e a sociedade fiscalizarão os projetos da Vale.
Histórico
A tragédia causada pelo rompimento da Minas Córrego do Feijão, em Brumadinho, aconteceu em 25 de janeiro de 2019, e tirou a vida de 272 pessoas – duas estavam grávidas. Onze joias - como os familiares se referem aos entes perdidos - ainda não foram localizadas.
A operação de busca e salvamento em Brumadinho é a maior já realizada no Brasil e na América Latina. Os militares do Corpo de Bombeiros de Minas seguem incansáveis atuando na região.
O Governo de Minas, desde o desastre, empenhou forças para garantir o suporte necessário aos atingidos, com a presença de diversos órgãos estaduais, como o Corpo de Bombeiros e a Defensoria Pública, momentos após a tragédia e permanentemente desde então, apoiando a comunidade e diagnosticando as necessidades específicas da população impactada e os prejudicados pelo rompimento da barragem.
Em agosto de 2020, foi apresentada pelo Governo de Minas, Ministério Público de Minas Gerais e Defensoria Pública de Minas Gerais petição à Justiça de pagamento por parte da Vale por reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem.
Com base num estudo feito pela Fundação João Pinheiro do impacto sobre o Produto Interno Bruto (PIB) do Estado, de R$ 22,2 bilhões, e as perdas com arrecadação de impostos, de R$ 4,4 bilhões, foi requerido à Vale R$ 26,6 bilhões a título de compensação socioeconômica à sociedade mineira.
Além disso, foram pedidos R$ 28 bilhões por danos morais coletivos e sociais. O pedido foi negado e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, desde então, vinha mediando as tentativas de acordo em audiências de conciliação entre as partes.