Augusto Aras alerta para riscos do uso de redes sociais e da comunicação para atacar pessoas e fragilizar instituições
Para Augusto Aras, a prática configura crime, desrespeita o devido processo legal e tem consequências que ultrapassam os limites virtuais
“Não podemos permitir que o rolo compressor da leviandade, potencializado pelo poder quase ilimitado da disseminação virtual, fragilize nossas instituições. Que taxe de coniventes, omissos ou até criminosos, aqueles que, na condução do seu trabalho, não abrem mão do respeito às leis, à ampla defesa, ao processo legal, que é marco indispensável para o nosso processo civilizatório”. A afirmação do procurador-geral da República, Augusto Aras, foi feita no Seminário Internacional Cibersegurança, Cibercriminalidade e Criminalidade Organizada Transnacional, realizado nesta terça-feira (26), em Braga, Portugal. Na ocasião, ele assinou protocolo para intercâmbio acadêmico e cultural entre a Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) e a Universidade do Minho. O PGR salientou que utilizar as ferramentas virtuais para destruir reputações, ameaçar pessoas e fragilizar as instituições é tão grave quanto usar a tecnologia para aplicar golpes que causam prejuízos milionários aos cidadãos ou promover o tráfico internacional de drogas e de pessoas.
Aras citou que um dos objetivos do evento – que reúne membros do MP, magistrados e juristas de Brasil e Portugal – é debater as formas de o Estado atuar, por meio de suas instituições e agentes, para combater uma gama cada vez maior de crimes praticados por meio da internet. Salientou que é fundamental que os integrantes das instituições conheçam ferramentas e normativos que podem ser aplicados no enfrentamento de práticas como terrorismo, tráfico de drogas, de pessoas e de órgãos, e de tentativas de influenciar os regimes políticos democráticos.
Para Augusto Aras, não é demais dizer que organizações cibercriminosas têm operado em todo o planeta terra, interferindo não somente em processos de natureza eleitoral, mas também em empresas, sequestrando dados, a vida privada das pessoas e, muitas vezes, incitando a violência com ameaças a instituições e a seus membros. “Quando se desgasta uma instituição está se atingindo o próprio Estado e, numa democracia, isto é uma lesão muito grave”. Ele lembrou que a comunicação livre, com liberdade de expressão, é indispensável à democracia, mas é preciso respeitar também “valores constitucionalmente protegidos, como a privacidade, a intimidade, a honra e a lisura dos certames eleitorais”.
Condenação antecipada – Augusto Aras chamou a atenção para o que definiu como prática irresponsável de pressionar as autoridades constituídas – por meio das redes sociais, do submundo da internet – para que ignorem os limites legais e condenem, antecipadamente, pessoas sobre as quais recaem suspeitas do cometimento de crimes. Para ele, trata-se de prática criminosa, ainda pouco percebida pela sociedade, mas que causa danos à imagem das pessoas, principalmente de autoridades, e atinge a credibilidade de instituições públicas e a própria democracia. “Vilipendiar a honra de alguém, apresentando essa pessoa como criminosa antes mesmo da instauração de um procedimento investigativo também é crime”, salientou.
De acordo com o PGR, em boa parte dos casos, a condenação prévia e indevida é provocada pela disseminação irresponsável e criminosa de notícias falsas sobre alguém ou sobre determinado fato relevante para a sociedade. “É lamentável que essas questões não fiquem somente no plano das mídias sociais. Mesmo no mundo acadêmico a incitação tem sido uma constante. A polarização tem sido destruidora da democracia”, afirmou o PGR destacando a necessidade de se “responsabilizar os agentes criminosos, por lesões decorrentes da exaltação midiática e artificial de ânimos, gerando comportamentos extremados”.
O PGR lembrou ainda que “o caminho do meio, de Aristóteles a Rui Barbosa, perdeu o sentido em uma sociedade que não sabe mais caminhar no caminho do justo”. De acordo com ele, a condenação prévia e o “cancelamento em redes sociais” pode acabar representando “uma espécie de morte civil, que é um dos trágicos efeitos que hão de merecer os cuidados da cibersegurança”, ressaltou.
No momento atual, segundo Aras, verifica-se grande distância entre os resultados do julgamento virtual e os do julgamento real, que sai dos tribunais e decorre da apreciação de indícios, provas e depoimentos, como prevê o devido processo legal. Ele afirmou que, no Brasil, é urgente a necessidade de se resgatar esse princípio em todas as suas dimensões para que os julgamentos sejam justos, “para que não tenhamos nulidades declaradas para fatos que sabemos muitos deles verdadeiros, mas que, por vícios processuais, comprometeram a prestação jurisdicional, a ministerial e as investigações policiais”.
Ao fim do pronunciamento, Augusto Aras disse que, se de um lado a sociedade tem o valor liberdade de expressão, do outro lado tem o dever de respeitar a privacidade, a intimidade e a honra e, mais ainda, os interesses coletivos e as instituições que decorrem do Estado moderno. O PGR concluiu sua participação no evento se dizendo esperançoso de que o debate contribua para que Brasil e Portugal estejam juntos na cruzada em busca do enfrentamento da cibercriminalidade, das organizações transnacionais e que promovam também ferramentas de cibersegurança.
Fonte: Secretaria de Comunicação Social- Procuradoria-Geral da República