Com os primeiros resultados das eleições municipais confirmados na noite de domingo, o presidente Jair Bolsonaro usou as redes sociais para negar que tivesse se empenhado em campanhas locais e afirmar que a “onda conservadora de 2022” chegou para ficar, enquanto os números da apuração mostravam o óbvio: ao menos nos municípios o poder do bolsonarismo parece ter diminuído.

“Minha ajuda a alguns poucos candidatos a prefeito resumiu-se a 4 lives num total de 3 horas”, escreveu, minimizando um empenho que, de fato, foi bem maior que isso. “A esquerda sofreu uma histórica derrota nessas eleições, numa clara sinalização de que a onda conservadora chegou em 2018 para ficar. Para 2022 a certeza de que, nas urnas, consolidaremos nossa democracia com um sistema eleitoral aperfeiçoado.”

O fracasso mais retumbante do presidente foi em uma das capitais em que Bolsonaro mais se envolveu pessoalmente, São Paulo. Celso Russomano (Republicanos), para quem o presidente chegou a gravar mensagens, saiu de um início promissor para terminar a campanha em quarto lugar, com 10,5% dos votos válidos --pior, deixou a segunda vaga no segundo turno para Guilherme Boulos, do PSOL, de esquerda.

Mesmo o segundo lugar de Carlos Bolsonaro (Republicanos) para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro não pode ser considerada uma grande vitória. O filho 02 também perdeu o posto de mais votado para Tarcísio Motta (PSOL) e fez cerca de 36 mil votos a menos que os 106 mil registrados em 2016.

Depois de dizer por vários meses que não iria se envolver nas campanhas municipais, Bolsonaro passou as últimas semanas empenhando-se na defesa de nomes para prefeitos e até para vereadores, em conversas com apoiadores, em lives e, em alguns casos, recebendo candidatos.

No sábado, fez um post com uma lista de alguns de seus candidatos preferidos --apagada no domingo quando o resultado começou a se mostrar desfavorável.

De 13 prefeitos citados explicitamente pelo presidente, dois foram eleitos, --Gustavo Nunes (PSL), em Ipatinga (MG), e Mão Santa (DEM), reeleito em Parnaíba (PI), possivelmente mais por seu histórico como governador de Estado, senador e prefeito do que pelo apoio presidencial.

Outros dois, Marcelo Crivella (Republicanos), e Capitão Wagner (Pros) disputam o segundo turno no Rio de Janeiro e em Fortaleza, respectivamente. No entanto, nenhum dos dois é considerado favorito para vencer a eleição.

Se o resultado de seus apoios para prefeito foi ruim, no caso de vereadores foi ainda pior. Dos 45 citados pelo presidente, apenas sete foram eleitos.

Da lista de cinco nomes publicados no sábado, que receberam apoio reforçado do presidente, quatro foram derrotados, incluindo a Wal do Açaí --ex-assessora apontada como funcionária fantasma da Câmara, candidata pelo Republicanos em Angra, e Clau de Luca (PRTB) e Sonaira Fernandes (Republicanos), em São Paulo, que Bolsonaro chegou a dizer que, se não fossem eleitas “pegaria mal” para ele.

Também perdeu a eleição Coronel Fernanda, candidata do Patriotas ao Senado na eleição suplementar do Mato Grosso.

Apesar do tom confiante de Bolsonaro em suas publicações, pessoas próximas do presidente como a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) e o secretário de assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins, mostraram incômodo com um resultado que claramente não foi o esperado pela extrema-direita.

“O que houve com os conservadores? Erramos, nos pulverizamos ou sofremos uma fraude monumental?”, escreveu Zambelli em sua conta no Twitter.

Já Martins apontou os erros no próprio grupo bolsonarista. “Enquanto batíamos cabeça para fazer o básico e tentar nos organizar, a esquerda se renovou, assimilou as lições de 2018 e soube usar a internet e a nova realidade política a seu favor. Ou fazemos a devida autocrítica, ou nossos erros cobrarão um preço ainda maior no futuro”, escreveu.

Sem partido há um ano, quando brigou e deixou o PSL para tentar fundar um partido próprio, o Aliança pelo Brasil --que até agora não conseguiu avançar--, Bolsonaro pulverizou apoios por diversos partidos, sem identificação com nenhum, apenas com os próprios candidatos.

Em meio a uma pandemia de Covid-19, crise econômica e desemprego crescente, apenas o nome do presidente não parece ter atraído eleitores mais preocupados com o que acontece em suas cidades.

“Eu creio que os resultados eleitorais mostram que a pandemia é uma espécie de freio de arrumação na política nacional. A tendência de antipolítica e de criminalização do sistema político tem perdido força pela incapacidade destes novos quadros de entregarem políticas públicas eficazes”, analisa o cientista político Creomar de Souza, chefe da consultoria Dharma Political Risk and Strategy.

“O eleitor acaba compreendendo essa falha de forma intuitiva e busca corrigir a escolha anterior, sobretudo, focado na esperança de que os serviços públicos melhorem”, acrescentou.

Os números do Tribunal Superior Eleitoral mostram um crescimento significativo de partidos tradicionais de centro e centro-direita, mas não um avanço da extrema-direita. MDB, com 772 prefeituras, PP, com 682 e PSD com 650 foram até agora os campeões de prefeitos eleitos. Demonizado pelo presidente, o PT ficou 179 prefeituras, segundo compilação do jornal O Globo. Outras 57 cidades ainda terão segundo turno.

Essa foi a análise feita pelo vice-presidente Hamilton Mourão, que saiu em defesa de Bolsonaro.

“O que foi dado a conhecer até o presente momento, não fiz nenhuma análise aprofundada, é que os partidos de centro tradicionais foram os grandes vencedores”, disse Mourão a jornalistas na manhã desta segunda.

“Não pode se debitar nada em relação ao presidente Bolsonaro porque ele não entrou de cabeça nessa eleição. Ele apoiou alguns candidatos, muito poucos. O presidente está sem partido e sem uma estrutura partidária fica difícil você participar de uma eleição.”

Fonte: Reuters